O Garde-Manger
Artigo revisado pelo Comitê
Originalmente e na Idade-média, Garde-Manger era o local de guarda de comidas frias, preservadas, curadas, queijos e embutidos em geral. Era um privilégio para reis, lordes e duquesa.
Boucherie e Charcutier
No século XVI, foram regulamentadas na França diversas profissões e limites de atuações. Quem vendia queijo não podia vender leite. Quem fazia pão também não podia vender presunto. Duas dúzias de guias e regulamentos foram escritos e todos foram unânimes na criação de uma profissão que seria uma etapa para se alcançar o Garde-Manger atual, a de Charcutier, cujo empreendimento era a Charcuterie, local que estava autorizado à produção e venda exclusiva de carne de porco processada, ou seja, este profissional não podia apenas matar o porco e desmembrá--lo em cortes, já que desta forma invadiria o campo de atuação do Boucher, sendo este o responsável pela Boucherie, que vinha a ser o açougueiro e açougue, respectivamente.
Os preparos que cabiam ao Charcutier eram bacon, presuntos, pâtés e lombos lardeados e bardeados, todos exclusivamente de carne de porco. Neste período de muita escassez, alimentar-se de proteína animal era privilégio de poucos e o profissional que mais tinha destaque era o Boulanger, o padeiro, já que este trabalhava com matéria prima barata e podia acessar quase todas as camadas sociais.
Ciente deste diferencial mercadológico, os Charcutiers criaram os pães recheados com pâtés, espécie de presunto que era assado dentro da massa de pão, desta forma, o preço do quilo do produto se barateava e alcançava novas camadas consumidoras.
Após algumas mortes, enforcamentos e decapitações, o direito do Charcutier trabalhar com massas de farinha de trigo foi parar nos tribunais, onde foi reconhecido sua possibilidade de reproduzir embutidos envoltos de pão, já que os padeiros não tinham desenvolvido a competência idêntica, mas com interpretação inversa que seria pães recheados com embutidos. Desta briga, nasceu um dos produtos mais emblemáticos do setor do Garde-Manger e da cozinha francesa, o Pâté-en-Croûte, um tipo de presunto mais pedaçudo envolto em massa Brisée ou massa de pão com espaços preenchidos com aspic gelée, uma espécie de gelatina e servidos fatiados. É facílimo de ser encontrado ainda hoje em boas rotisseries europeias, principalmente francesas.
Faisandé
Outra preparação interessante que nasceu nos escuros porões do que viria a ser o Garde-Manger foi o processo de Faisandé. Após a caça dos faisões e outras aves silvestres, estas eram penduradas pelo bico em varais. Após alguns dias o pescoço rompia e a ave caia, estando assim própria para o consumo. É inegável que já havia aí um estágio de putrefação. O processo é semelhante ao que conhecemos hoje como maturação, guardadas as proporções e controles de risco e temperatura, mas certamente se hoje repetirmos esse processo como antigamente teremos uma grave infecção intestinal. Nossos organismos não têm a mesma resistência daqueles que viveram nesta época sem refrigeração.
O Garde-Manger atual
Hoje o setor do Garde-Manger é um dos mais importantes da cozinha. É desta área que saem os grandes chefs e onde se iniciam os aprendizes, já que a habilidade com faca para cortes precisos, combinação de cores e decorações são competências de quem se dispõe a atuar nessa área, é a primeira etapa antes dos Commis (aprendizes) partirem para a praças dos assados, dos peixes e para o fogão central e depois a boqueta. A boqueta é aquela pequena janela entre a cozinha e o salão onde o chef permanece visualizando, e antigamente provando tudo que saia da cozinha, era função dele também anunciar os pedidos ou gritar, esse cargo era denominado de Aboyeur (pregoeiro), mas por volta de 1870, o chef Auguste Escoffier com a intenção de silenciar e acalmar a cozinha redenominou este personagem como Annonceur (mensageriro), em algumas cozinhas a gritaria permanece até hoje. A preparação de queijos, linguiças e embutidos, saladas, canapés, finger foods, terrines, galantines, balontines, pâtés, dentre várias preparações que exigem precisão e belas apresentações saem das mãos desses artistas Garde-Manger.
Por Rodrigo Viriato